Meu nome não é Ramona: quando a autoafirmação parte de uma negação

Resenha do filme "Meu nome é Ray"

Meu Nome é Ray (3 Generations, título original) desenvolve a trama de uma mãe que tenta entender que sua filha adolescente (Ramona) é, na verdade, um menino transgênero (Ray). Disponível na Netflix, o filme não se limita a esse ponto, é notável a preocupação dos criadores em abordar diferentes óticas da situação, como o preconceito dentro da própria comunidade LGBT.


Tratar de tabus nunca é uma coisa fácil e amigável, principalmente quando se realmente pretende dialogar com pessoas que apresentam uma forte carga de conceitos morais preestabelecidos. Nesse sentido, a trama se apresenta bem diplomática, a disposição dos personagens dá margem para que o espectador possa se identificar com uma das imagens apresentadas e realmente se envolver na trama.

O filme aborda um delicado passo na troca de gênero: o agressivo, em termos biológicos, tratamento hormonal. Isso se torna ainda pior quando a responsabilidade ainda é parental, o peso e a culpa de um possível arrependimento futuro é algo recorrente no discorrer da história. Diante dessa preocupação, a avó de Ray (Susan Sarandon), que é homossexual, sugere que ele simplesmente se torne lésbica. A ignorância e o desrespeito parte de dentro da comunidade LGBT, um ambiente que deveria ser acolhedor acaba, em muitos casos, sendo um lugar hostil, no qual as pessoas não estão cientes da diferença entre orientação sexual e identidade de gênero e perpetuam preconceitos.

Outra questão que ajuda a construir a trama são os enredos secundários. Em alguns momentos, o fato de Ray ser um transgênero passa despercebido e são apresentadas situações que qualquer pessoa pode enfrentar, como ter que lidar com a separação entre os pais. Apesar de ser considerado algo negativo por alguns por desviar da temática principal, essas “fugas” são fundamentais para a desconstrução de certos preconceitos por parte do espectador, que passa a enxergar o script com uma maior familiaridade.

A transfobia ainda é um dos preconceitos mais impactantes na vida prática de uma pessoa, assim como conta Cris Stefanny, presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), para a Carta Capital: 
A maioria está no mercado do sexo justamente por não conseguir oportunidade no mercado legal de trabalho. Não tem como você virar uma esquina sem sofrer os olhares tortuosos, os comentários maldosos. As pessoas não conseguem assimilar que uma travesti pode ter um emprego formal. Quando uma travesti sai na rua, a primeira coisa que o sujeito faz é parar o carro e perguntar quanto é o programa”. (Confira a matéria completa).
As questões levantadas pelo filme têm uma relação muito grande com a realidade. Ainda que tenham ganhado espaço ultimamente, inclusive em uma novela de horário nobre da Rede Globo, ainda há muito a ser feito, a discussão e a representatividade são imprescindíveis para que a sociedade consiga renovar seus olhos.


Links Relacionados



Naruhodo #84 - O que leva uma pessoa a ser transgênero? (Podcast conduzido pelo leigo curioso, Ken Fujioka, e o cientista PhD, Altay de Souza. 38min47s)

Transfobia: um tapa na cara (Panorama geral do cenário, construído principalmente pela apresentação de casos e relatos. Produzido pela Carta Capital)

transfobia doc: "(trans)fobias" (Vídeo documentário produzido para explicar e denunciar algumas situações de transfobia)

Transição de Roupas (Campanha desenvolvida para a Cruz Vermelha do Rio de Janeiro para arrecadação de roupas para transgêneros)
Leonardo Maia

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Instagram